Na próxima segunda-feira, a Câmara dos Deputados define o seu presidente para o biênio 2021-2022. Rivais na disputa, os parlamentares Arthur Lira (PP-AL) e Baleia Rossi (MDB-SP) protagonizaram um pleito marcado por pragmatismo, união de diferentes espectros políticos, racha de bancadas partidárias e participação crucial do Executivo.
Nos bastidores, com a negociação de emendas, ou explicitamente, com declarações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para quem “o deputado Arthur Lira, se Deus quiser, será o nosso presidente”, o Governo atua para ter um aliado na Casa, após dois anos de episódios de amor e desavenças com o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).
O cenário já esteve mais equilibrado entre Lira e Rossi. No recorte de momento, com o empenho do Executivo e a perspectiva de oferecimento de cargos e emendas, o resultado mais factível é a vitória do candidato de Bolsonaro, que, apesar de ser viabilizado pelo Planalto, busca sempre reiterar que seu eventual mandato terá um viés independente.
Esse discurso é um dos motivos que levam Lira, mesmo sendo apoiado por Bolsonaro, a trafegar com habilidade entre parlamentares de partidos progressistas como o PSB, onde, apesar do apoio formal a Baleia, reiterado na semana passada pelo governador de Pernambuco, Paulo Câmara, as dissidências são manifestadas desde o ano passado, caso do deputado Felipe Carreras. Levando em conta que o voto para a eleição da Casa é secreto, há a expectativa de que outros episódios desse tipo ocorram, com vantagem para Lira.
No entendimento de Elton Gomes, cientista político e professor da Faculdade Damas, apesar de Baleia Rossi contar com capacidade de articulação, é Lira quem domina essa faceta na disputa. “Arthur Lira consegue uma boa performance por sua capacidade de articulação política e seu nível de capilaridade. Ele tem interlocução grande não só entre legendas do centro, mas também entre legendas que inicialmente tinham decidido apoiar Baleia Rossi e dão sinais de deserção”, avalia.
Maia x Bolsonaro
A interferência do Executivo Federal motivou críticas de Rodrigo Maia, principal viabilizador da candidatura de Baleia Rossi.
O democrata viu o cenário favorável ao seu candidato, com união de partidos de direita, centro e esquerda - do PSL ao PT - mudar para um cenário de incerteza dos votos até mesmo dentro do DEM, seu próprio partido. Nesta semana, Maia fez um apelo aos deputados, frisando que “a intenção do presidente é transformar o Parlamento num anexo do Palácio do Planalto”.
Elton Gomes destaca que os quatro anos nos quais Maia esteve à frente da Câmara lhe renderam relevância e capacidade de articulação, mas também geraram inimigos. O professor ainda cita como um agravante o fato de Maia ser tido como um “desafeto do presidente”.
A retórica de Maia, voltada para a independência do Legislativo é costumeiramente sublinhada pelos parlamentares que escolheram apoiar Baleia. “O Congresso é um dos três poderes da República, e a Constituição determina autonomia e independência. O Parlamento não pode virar um puxadinho do Palácio do Planalto. Seria ruim para a Democracia e para as decisões do Legislativo. Por isso, vários partidos, com posições ideológicas diferentes, se juntaram para defender uma Câmara Soberana”, justifica o deputado Renildo Calheiros (PCdoB).
Na última quinta, Lira declarou que “na presidência da Câmara ninguém influi", como forma de se desassociar da tese de que o apoio de Bolsonaro o tornaria fiel aos interesses do Planalto.
Para o deputado André de Paula, Lira é capaz de fazer “a Câmara voltar a viver seus melhores dias”. “A Câmara precisa voltar a ser o grande fórum de debates e decisões nacionais, um poder colegiado onde a maioria se afirma. Arthur exerce uma liderança firme e democrática na Casa. Ele tem energia política para fazer acontecer”, afirma. Fernando Monteiro (PP), correligionário de Lira, crê que o candidato “vem se preparando há muito tempo para esse desafio”. “Com ele teremos uma Câmara tranquila, com um cenário que permitirá o andamento das ações necessárias e urgentes”, destacou.
Impeachment
Uma das incumbências do presidente da Câmara é justamente colocar em pauta o processo de impeachment do presidente da República, possibilidade que retornou ao debate nas últimas semanas, sobretudo, por conta do agravamento da pandemia. Atualmente, porém, até mesmo a vitória de Baleia Rossi, que conta com o apoio declarado de partidos de oposição, não parece colocar em risco a continuidade de Bolsonaro.
“Baleia Rossi aglutina partidos que apoiam o impeachment, mas traz também outros partidos como o próprio DEM que não apoiam o impeachment. Essa pauta só vai crescer, germinar e dar frutos se houver algum tipo de consenso político sobre ela”, avalia a cientista política Priscila Lapa.
Élton sublinha que para presidentes recém-empossados nas Casas Legislativas “abrirem um processo de impeachment é um péssimo negócio”. “Quando eleitos, eles querem contemplar aliados, distribuir cargos e verbas para se fortalecer com o grupo de parlamentares. Abrir um processo de impeachment nesse cenário prejudica todo mundo, inviabiliza negociações. Diante disso, não existem condições objetivas, hoje, para um processo. Bolsonaro já cometeu atos que dão motivos jurídicos, mas não há condição política hoje.”
Sem o impeachment, Bolsonaro poderá avançar na segunda metade do seu mandato, considerada por Priscila Lapa como determinante para 2022. “São as ações desses dois anos que vão ficar mais frescas na cabeça do eleitor”, disse.
Senado
Diante dos ânimos exaltados na Câmara, o embate entre Rodrigo Pacheco (DEM-MG), candidato apoiado por Davi Alcolumbre, e Simone Tebet (MDB-MS) pelo Senado torna-se praticamente coadjuvante na segunda-feira. A expectativa é de que Pacheco confirme o favoritismo pavimentado pelo apoio até mesmo de senadores do MDB de Tebet.
A tendência é que o MDB fique com a vice-presidência da Casa, com o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB), como um dos cotados para ocupar o posto. A migração do MDB, no entanto, não foi unânime. O senador Jarbas Vasconcelos reiterou o seu apoio a Tebet. “Ela reúne todas as condições de fazer um excelente trabalho no comando do Senado Federal. A sua eleição, que representaria a eleição da primeira mulher à frente da Casa, fará muito bem a todo o Legislativo e ao País”, frisou.
O senador Humberto Costa (PT), assim como toda a bancada petista no Senado, já havia exposto o apoio a Pacheco. Segundo Humberto, o apoio se dá “com base em uma carta de princípios apresentada, que ele (Pacheco) acolheu integralmente”. “Nosso partido também assegurou espaços políticos importantes nas instâncias do Senado para a luta contra esse governo nefasto de Bolsonaro”, disse.
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